Primeiro diálogo
Caps. 3—14
A queixa de Jó
Cap. 3
1-2 Finalmente Jó quebrou o silêncio e amaldiçoou o dia do seu nascimento. Jó disse:

3 “Maldito o dia em que nasci!
Maldita a noite em que disseram:
‘Já nasceu! É homem!’
4 Que aquele dia vire escuridão!
Que Deus, lá do alto, não se importe com ele,
e que nunca mais a luz o ilumine!
5 Que a escuridão e as trevas o dominem;
que as nuvens o cubram e apaguem a luz do sol!
6 Que aquela noite fique sempre escura
e que desapareça do calendário!
7 Que seja solitária e triste aquela noite,
e que nela não se escutem gritos de alegria!
8 Que seja amaldiçoada pelos feiticeiros,
aqueles que têm poder sobre o monstro Leviatã !
9 Que escureçam as estrelas da sua manhã;
que ela espere a luz, e a luz não venha;
e que a sua madrugada não chegue,
10 pois ela deixou que minha mãe me desse à luz
e não me poupou de todo este sofrimento!
Por que não nasci morto?
11 “Por que não nasci morto?
Por que não morri ao nascer?
12 Por que a minha mãe me segurou no colo?
Por que me deu o seio e me amamentou?
13 Se eu tivesse morrido naquele momento,
agora estaria dormindo,
descansando em paz.
14 Estaria com reis e altas autoridades
que reconstruíram palácios antigos
15 ou estaria com governadores
que encheram as suas casas de ouro e de prata.
16 Se a minha mãe tivesse tido um aborto, às escondidas,
eu não teria existido
e seria como as crianças que nunca viram a luz do dia.
17 Na sepultura acaba a agitação dos maus,
e ali repousam os que estão cansados.
18 Ali os prisioneiros descansam juntos
e já não ouvem mais os gritos do capataz.
19 Ali estão os importantes e os humildes,
e os escravos ficam livres dos seus donos.
Por que os infelizes continuam vivendo?
20 “Por que os infelizes continuam vendo a luz?
Por que deixar que vivam os que têm o coração amargurado?
21 Eles esperam a morte, e ela não vem,
embora a desejem mais do que riquezas.
22 Eles ficam muito alegres e felizes
quando por fim descem para a sepultura.
23 Deus os faz caminhar às cegas
e os cerca de todos os lados.

24 “Em vez de comer, eu choro,
e os meus gemidos se derramam como água.
25 Aquilo que eu temia foi o que aconteceu,
e o que mais me dava medo me atingiu.
26 Não tenho paz, nem descanso, nem sossego;
só tenho agitação.”
Jó amaldiçoa o seu nascimento e lamenta a sua miséria
1 Depois disso, começou Jó a falar e amaldiçoou o seu dia. 2 E Jó disse:
3 Pereça o dia em que nasci
e a noite que disse:
Foi concebido um homem.
4 Converta-se aquele dia em trevas;
não olhe Deus para ele lá de cima,
nem sobre ele resplandeça a luz.
5 Reclamem-no para si as trevas e a sombra da morte;
sobre ele façam as nuvens a sua habitação;
espante-o tudo o que escurece o dia.
6 Aquela noite! Dela se apoderem densas trevas;
de que têm cantado os homens cantam.
não entre em o número dos meses.
7 Seja estéril aquela noite,
e nela não se ouçam vozes de regozijo.
8 Amaldiçoem-na os que amaldiçoam o dia
e são peritos em suscitar o Leviatã.
9 Escureçam-se as estrelas da sua alva;
espere ela a luz, e a luz não venha,
e não veja as pálpebras da manhã,
10 Porque não fechou as portas do ventre de minha mãe,
nem escondeu dos meus olhos a aflição.
11 Por que não morri ao sair da madre?
Por que não expirei ao deixar as entranhas?
12 Por que me receberam os joelhos?
Ou por que os peitos me amamentaram?
eu dormiria e assim teria estado em descanso,
14 juntamente com os reis e conselheiros da terra
que edificaram para si mausoléus;
15 ou como os príncipes que possuíram ouro,
os quais encheram as suas casas de prata;
16 ou como aborto oculto eu não teria existido,
como infantes que nunca viram a luz.
17 Ali, os ímpios cessam de inquietar,
e ali descansam os cansados.
18 Ali, os encarcerados juntos repousam;
não ouvem a voz do encantador.
19 O pequeno e o grande ali estão,
e o servo está livre do seu senhor.
20 Porque se concede luz ao aflito,
e vida, aos amargurados de alma,
21 que esperam a morte, sem que ela venha,
e cavam em procura dela mais do que de tesouros escondidos;
22 que se regozijam em extremo
e exultam quando podem achar a sepultura?
23 Ao homem cujo caminho está escondido,
e a quem Deus cercou de todos os lados?
24 Como a minha comida, vêm os meus suspiros,
e, como águas, se derramam os meus gemidos.
25 Pois aquilo que temo me sobrevém,
e o de que tenho medo me acontece.
26 Não tenho repouso, nem estou quieto, nem tenho descanso,
mas vem inquietação.